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Na perspectiva bakhtiniana, dialogismo é a ordem do enunciado, sua natureza, sua regra, seu mandamento. Enquanto materialidade significante, o enunciado não se fecha em si mesmo, pois ele apenas se constituirá como enunciado nesse interminável diálogo entre enunciados outros, ditos alhures ou ainda os não ditos. O dialogismo apresenta-se como fundamento de toda a discursividade; pois, considere-se que todo enunciado, enquanto materialidade discursiva abriga um universo de vozes sociais em múltiplas relações de convergência e de divergência, de harmonia e de conflito, de aceitação e de recusa. Partindo desse princípio, o texto, na sua qualidade de enunciado, é compreendido, no seio dos estudos literários, como uma voz que dialoga com outros textos, funcionando também como ecos das vozes de seu tempo, de sua história, revelando os valores, as crenças, as vontades de verdade de uma dada formação social. A partir dessa perspectiva, trazemos uma releitura de um tradicional conto popular de origem de língua românica europeia que ficou conhecido em todo o mundo como a história da Cinderela ou da Gata Borralheira, sobretudo, após a publicação dos Contos da Mamãe Gansa, do escritor francês, do século XVII, Charles Perrault. Na realidade, as transformações dessa narrativa são tão variadas, quanto necessárias, pois funcionam como aparelhos que sinalizam importantes mudanças sociais e, neste caso, apontam para as conquistas femininas nos mais variados âmbitos. Assim, o nosso trabalho, à luz dos pressupostos teóricos da Análise de Discurso, busca analisar as vozes que ecoam no conto A Cinderela mudou de ideia, de Nunila López Salamero (2009), evidenciando as vontades de verdade acerca da identidade dos sujeitos mulher e homem que desse conto fazem sítio. |