'Se nós não fosse guerreio nós não existia mais aqui': ensino-aprendizagem de línguas para fortalecimento da luta Guarani, Kaingang e Laklãnõ-Xokleng

Autor: Guerola, Carlos Maroto
Přispěvatelé: Universidade Federal de Santa Catarina, Lucena, Maria Inêz Probst
Jazyk: portugalština
Rok vydání: 2017
Předmět:
Zdroj: Repositório Institucional da UFSC
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
instacron:UFSC
Popis: Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Programa de Pós-Graduação em Linguística, Florianópolis, 2017. A presente pesquisa foi desenvolvida dentro da área de estudos da Linguística Aplicada indisciplinar, a partir da metodologia de pesquisa etnográfica, no âmbito do programa de formação continuada de professores indígenas Ação Saberes Indígenas na Escola (ASIE), criado a nível nacional pelo Ministério de Educação em 2013 e implementado em Santa Catarina pela UFSC entre 2015 e 2017. O trabalho tem como objetivo geral construir alternativas teóricas para o ensino-aprendizagem escolar das línguas guarani, kaingang e laklãnõ-xokleng, reinventadas enquanto processos sociais, visando o fortalecimento da luta dessas populações. Essas alternativas teóricas são construídas com base em discursos (dos quais se oferece registro audiovisual) enunciados por professores, lideranças e sábios durante os Grandes Encontros da ASIE em terras indígenas, assim como com base nas reflexões em torno das práticas materiais desses Grandes Encontros nas quais se constatou a enunciação natural, fácil, espontânea e abundante em línguas indígenas. Em prol da análise interpretativa desses discursos e práticas materiais, é tecida uma fundamentação teórica (que tem como insumo principal postulados de Mikhail Bakhtin e Michel Foucault) em torno do discurso, das línguas e do controle que se exerce sobre os mesmos por meio de procedimentos que buscam estabelecer regras, de acordo com geografias e economias políticas de verdade, para legitimar e privilegiar certos discursos e enunciadores, destacando o papel da instituição escolar nesse processo. Seguidamente, são problematizados os discursos que a tradição linguística e filológica ocidental tem privilegiado em relação às línguas, principalmente aqueles que as representam como sistemas autônomos de normas indestrutíveis. Caracterizando tais discursos sobre as línguas como invenções a serviço da dominação política e econômica colonial e neocolonial, com efeitos colaterais particularmente nocivos para os povos indígenas, aponta-se, posteriormente, para o modo em que esses discursos e consequências nocivas continuam vivas ainda hoje em práticas escolares, o que não é diferente em contextos indígenas. Em prol de contribuir para a reconfiguração dessa situação, criticada pelos participantes da pesquisa, propõe-se uma reinvenção das línguas com base nas teorizações do geógrafo David Harvey, que caracteriza os processos sociais como consistentes na articulação de seis momentos interdependentes, quais sejam, discurso, poder, instituições, práticas materiais, relações sociais e imaginário. A partir da interação entre a fundamentação teórica e os dados etnográficos, gerados ao longo de 34 meses de envolvimento em campo do pesquisador também enquanto supervisor da ASIE na UFSC, a análise se desenvolve em torno desses momentos e das categorias força, luta, sistema, papel, tempo e espaço. A partir da reflexão, com base nessas categorias, em torno das práticas materiais retratadas em relatos literário-fotográficos, propõe-se uma alternativa teórica para o ensino-aprendizagem escolar de línguas indígenas consistente em professores e estudantes participarem, em virtude da força e da luta indígena, em práticas de liberdade de educação escolar diferenciada, isto é, em práticas pautadas nas orientações dos mais velhos e desenvolvidas em espaços-tempos que favoreçam o estreitamento e fortalecimento da convivência, da prática, da oralidade e do movimento conjunto entre anciões, professores e estudantes, assim como as crenças, valores e desejos associados a esses tempos-espaços e relações sociais, dentro de uma temporalidade híbrida entre a temporalidade da educação indígena e a temporalidade da educação escolar. Abstract : This research was conducted in the field of indisciplinarian Applied Linguistics, following an ethnographic methodological approach, within the in-service indigenous teachers training program Ação Saberes Indígenas na Escola (ASIE), created at a national level by the Brazilian Department of Education in 2013 and implemented in the state of Santa Catarina by UFSC between 2015 e 2017. Its main goal is to build theoretical alternatives for teaching-learning Guarani, Kaingang and Laklãnõ-Xokleng languages, reinvented as social processes, at school, aiming at strengthening the struggle of those populations. These theoretical alternatives are built upon discourses (of which audiovisual register is offered) uttered by teachers, chiefs and sages during the Great Meetings of ASIE in indigenous lands, as well as upon reflections on the material practices of those Meetings in which natural, easy, spontaneous and abundant utterance in indigenous languages was witnessed. To serve the interpretive analysis of those discourses and practices, the theoretical background (that relies primarily on Mikhail Bakhtin e Michel Foucault) focuses on discourse, languages and how control is exerted over them through procedures that aim at establishing rules, grounded on geographies and political economies of truth, in order to legitimate and favor certain discourses and utterers, highlighting the role of schools within this process. Afterwards, the discourses on languages favored by Western linguistic and philological tradition are questioned, chiefly those that represent them as autonomous systems of indestructible rules. Characterizing those discourses on languages as inventions that serve the purposes of colonial and neo-colonial political and economic domination, with particularly harmful effects on indigenous populations, it is discussed next how those discourses and harmful effects are kept alive still today in school practices, also in those of indigenous contexts. In order to contribute to change that situation, criticized by the participants of the research, a reinvention of languages is proposed grounded on David Harvey?s theory that describes social processes as consisting in the articulation of six interdependent moments, i.e., discourse, power, institutions, material practices, social relations and imaginary. Through the interaction between the theoretical background and the ethnographic data, generated throughout 34 months during which the researcher was in the field also as supervisor of ASIE at UFSC, the analysis is carried out around those moments and the categories strength, struggle, system, paper, time and space. Upon the reflection, grounded on those categories, on the material practices portrayed in literary-photographic tales, a theoretical alternative is put forward to teach-learn indigenous languages as social processes at school that consists in teachers and students getting involved, by virtue of the indigenous strength and struggle, in differentiated school practices of freedom, that is, practices whose guidelines are provided by the elderly and are developed in times-spaces that favor the strengthening of the coexistence, the practice, the orality and the shared movement of the elderly, teachers and students, as well as the believes, values and desires associated to those times-spaces and social relationships, within a hybrid temporality between the temporality of indigenous education and the temporality of school education.
Databáze: OpenAIRE