Manifesto de Curitiba: pela Prevenção Quaternária e por uma Medicina sem conflitos de interesse
Autor: | Marc Jamoulle, Sandro Rodrigues Batista, Guilherme Ramos Sens, Eno Dias de Castro Filho, Miguel Pizzanelli, Juliana Oliveira Soares, Tarso Pereira Teixeira, André Luiz da Silva, Luciano Nunes Duro, Raquel Vaz Cardoso, Ana Duboc Rochadel, Dijon Hosana Souza Silva, Waldomiro Reis Júnior, Hamilton Lima Wagner, Rodrigo Luciano Bandeira de Lima, Derelie Mangin |
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Rok vydání: | 2014 |
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Zdroj: | Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, Vol 9, Iss 33 (2014) Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade; Vol. 9 No. 33 (2014): Outubro-Dezembro; 371-374 Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade; Vol. 9 Núm. 33 (2014): Outubro-Dezembro; 371-374 Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade; v. 9 n. 33 (2014): Outubro-Dezembro; 371-374 Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) instacron:SBMFC |
ISSN: | 2179-7994 1809-5909 |
DOI: | 10.5712/rbmfc9(33)1006 |
Popis: | Nos, medicos de familia e comunidade reunidos no I Seminario Brasileiro de Prevencao Quaternaria, trazemos o seguinte manifesto em prol de uma Medicina isenta de conflitos de interesses e imbuida de profissionalismo no seu sentido mais pleno. Estamos baseados nos seguintes pressupostos: Codigo de Etica Medica 1 II - O alvo de toda a atencao do medico e a saude do ser humano, em beneficio da qual devera agir com o maximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional; IV - Ao medico cabe zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho etico da Medicina, bem como pelo prestigio e bom conceito da profissao; V - Compete ao medico aprimorar continuamente seus conhecimentos e usar o melhor do progresso cientifico em beneficio do paciente; IX - A Medicina nao pode, em nenhuma circunstância ou forma, ser exercida como comercio; XIV - O medico empenhar-se-a em melhorar os padroes dos servicos medicos e em assumir sua responsabilidade em relacao a saude publica, a educacao sanitaria e a legislacao referente a saude; XXIII - Quando envolvido na producao de conhecimento cientifico, o medico agira com isencao e independencia, visando ao maior beneficio para os pacientes e a sociedade; ... E vedado ao medico: Art. 68. Exercer a profissao com interacao ou dependencia de farmacia, industria farmaceutica, otica ou qualquer organizacao destinada a fabricacao, manipulacao, promocao ou comercializacao de produtos de prescricao medica, qualquer que seja sua natureza. ... E vedado ao medico: Art. 104. Deixar de manter independencia profissional e cientifica em relacao a financiadores de pesquisa medica, satisfazendo interesse comercial ou obtendo vantagens pessoais. Conceito de profissao enquanto compromisso com valores profissionais Uma profissao e: 1. livre da influencia do comercio e do Estado e 2. responsavel pela sua propria educacao e estrutura de conhecimento 2 E conceito de Prevencao Quaternaria 3 “ Acao feita para identificar pacientes em risco de sobremedicalizacao, para os proteger de mais intervencoes em saude e para lhes sugerir intervencoes eticamente aceitaveis” (Adaptado de Jamoulle e Roland, 1995) Portanto, nos, medicos defensores da prevencao quaternaria em qualquer nivel de atencao a saude, defendemos os principios bioeticos em prol do melhor e do mais aceitavel para a populacao: − Nao-maleficencia: partindo do pressuposto hipocratico de “em primeiro lugar nao causar dano” ( primum non nocere ), sempre levaremos em conta o fato de que, quanto maior o risco de causar dano, mais embasado cientificamente e isento de interesses diversos do cientifico deve ser o procedimento em questao para que este possa ser considerado um ato eticamente aceitavel, mesmo que para tal se faca necessario questionar aspectos metodologicos e conflitos de interesses em protocolos e diretrizes (muitas destas tidas como conhecimento inquestionavel, porem gerado sob uma perspectiva comercial), sempre pautados na melhor evidencia cientifica isenta disponivel, e evitando ao maximo a “ Disease Mongering ” (promocao da doenca), a transformacao de fatores de risco e eventos fisiologicos em doencas, a medicalizacao desses eventos ou o excesso diagnostico, que podem por a pessoa em risco de estigmas e danos posteriores. − Beneficencia: pensando no melhor para o paciente (do grego pathe – sentimento –, com seus desdobramentos no latim patientem – aquele que sofre –, e pax – paz, paciencia), estaremos em busca sempre das melhores e mais adequadas evidencias cientificas livres de conflitos de interesses para promover a saude das doencas, com o minimo de intervencoes possiveis. Significa que buscaremos desenvolver acoes proativas “para o bem do paciente”, livres de influencias externas, lembrando que condutas expectantes ou mesmo a desprescricao tambem sao acoes proativas para o beneficio das pessoas. E o efeito benefico envolve tambem proteger as pessoas de informacoes inadequadas e reduzir a angustia causada pela Disease Mongering , alem de fornecer informacoes adequadas a essas pessoas para que elas mesmas pesem riscos e beneficios e tomem suas decisoes por meio da persuasao puramente profissional-relacional, visando ao melhor resultado possivel para aquela pessoa. − Autonomia: a autonomia ou autodeterminacao envolve dois aspectos durante o estabelecimento da relacao medicopaciente: 1. capacidade para atuar deliberadamente, o que envolve razao e discernimento para decidir entre as alternativas que lhe sao apresentadas e 2. liberdade, no sentido de estar livre de qualquer influencia controladora para a emissao de um posicionamento. 4 Portanto, e nossa premissa empoderar a populacao com as informacoes mais confiaveis possiveis para a tomada de decisao conjunta diagnostica ou terapeutica, sem manipulacao nem coercao, mas com a avaliacao correta de riscos e beneficios, em especial naqueles procedimentos onde ainda ha fraco embasamento cientifico e onde ha fortes influencias de industrias farmaceuticas ou de produtos medicos-hospitalares, e mesmo de corporacoes com interesses mercantilistas, indo de encontro aos principios aqui discorridos. E nossa premissa tambem tornar as pessoas conhecedoras para uma melhor tomada de decisao, ja que o conhecimento, e nao a desconfianca, e a melhor ferramenta para a prevencao quaternaria. 5 − Justica: tambem e nossa premissa, enquanto promotores e defensores da prevencao quaternaria, a luta pelo acesso equânime, justo e apropriado aos recursos em saude, denunciando a mercantilizacao da saude e o uso do sistema sanitario para finalidades diversas do beneficio das pessoas, reforcando que justica e acesso nem sempre estao relacionados as “ultimas novidades tecnologicas em saude”. Nos nao cuidamos de orgaos. Nos nao promovemos doencas. Nos nao superestimamos fatores de risco. Nos cuidamos de pessoas, e pessoas nao sao numeros, escores, fatores de risco e nem meros objetos de intervencoes. Nos somos cautelosos com resultados surpreendentes de publicacoes cientificas, pois dados podem ser manipulados para diagnosticar sintomas menores ou fatores de risco e assim reduzir os pontos de corte do diagnostico de uma doenca, bem como para criar “pre-doencas”, aumentar o espectro de medicalizacao e gerar de forma perniciosa lucros para a industria farmaceutica. 6 Nos respeitamos o tempo na ciencia e respeitamos a linha do tempo da relacao medico-paciente, pois o aspecto relacional na atencao em saude sempre prevalecera sobre o aspecto populacional. Por todo o exposto, apontaremos sempre as industrias e corporacoes mercantilistas da saude com seus “achados extraordinarios”, lutaremos contra a criacao de estigmas e rotulos nas pessoas, lutaremos contra o excesso diagnostico e terapeutico, promovendo habitos saudaveis pautados na ciencia medica, livres de conflitos de interesses e de vieses de publicacoes puramente deterministas ou causais, mas acima de tudo promovendo uma boa comunicacao com as pessoas para que elas possam tambem aprender a se proteger do excesso de intervencoes em saude. E nosso papel advogar pela legitimidade na relacao profissional-paciente, reconhecendo as incertezas inerentes a ciencia medica em si. Devemos orientar o cuidado de forma nao normativa, apoiando-se em evidencias isentas e permitindo o feedback do paciente, de modo que ele possa interpretar e ajustar a decisao para si enquanto protagonista do seu cuidado. Curitiba, novembro de 2013. |
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