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Neste estudo foram analisadas as rasuras, marcadas por apagamentos, inserções, sobreposição, ligadas ao conflito entre a variante fonética falada pelo escrevente e a imagem que o escrevente supõe da representação gráfica prescrita pela escola. Para tanto, consideram-se as rasuras um momento de “aceitação” e “recusa” do escrevente à heterogeneidade da (sua) escrita. A hipótese que norteia este estudo é que as rasuras não são aleatórias, mas sim emergem de momentos de conflito entre duas possibilidades de representação da escrita, nas quais o escrevente se deslocaria entre aquele que “escreve” e aquele “lê”, avaliando a sua escrita de um outro lugar (LEMOS, 1999). Adota-se para tanto, o referencial teórico da heterogeneidade constitutiva da escrita (CORRÊA, 2004), na qual se supõe a não existência de enunciados puramente escritos ou falados. As rasuras são consideradas momentos de negociação do escrevente com os diferentes modos de representação da (sua) escrita. O corpus examinado refere-se a 449 enunciados escritos por crianças da antiga primeira série do Ensino Fundamental I, ao longo do ano de 2001. Nesse corpus, foram identificadas 35 rasuras. Dentre os principais momentos de conflitos ressalta-se: a omissão da coda vibrante final, em que o escrevente busca a manutenção do padrão silábico (CV); a marcação do ditongo; o registro das vogais pretônicas; e a neutralização das vogais postônicas finais. Portanto, os conflitos observados neste estudo são consubstanciais à linguagem, não-coincidências que emergem na superfície do dizer, em que o escrevente por meio de ‘escolhas’ e ‘recusas’ circula pela gênese da escrita e pela representação do código institucionalizado, destacando o conflito na representação da (sua) escrita, constitutivamente heterogênea. |