Tomada de decisão no sistema de proteção das crianças e jovens: Um estudo comparativo entre as atitudes de profissionais e de estudantes
Autor: | Delgado, Paulo, Carvalho, J.M.S, Pinto, V.S. |
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Přispěvatelé: | Repositório Científico do Instituto Politécnico do Porto |
Jazyk: | portugalština |
Rok vydání: | 2018 |
Předmět: | |
Zdroj: | Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) instacron:RCAAP |
Popis: | Face a situações de maus tratos ou de violência, a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, Lei 142/2015 de 8 de setembro, procura salvaguardar o desenvolvimento e o bem-estar da criança ou do jovem. Em situações mais graves, a intervenção pode levar à retirada da sua família, considerando-se o acolhimento familiar como o contexto privilegiado para a colocação de crianças em perigo, em especial as que têm até 6 anos de idade. Apesar da recente alteração no quadro legal, o acolhimento em Portugal continua a ser, quase exclusivamente, de tipo residencial. Em Portugal, no ano de 2016, encontravam-se 8.175 crianças acolhidas, das quais apenas 3,1% viviam em famílias de acolhimento. Esta matriz protetora põe em causa um dos direitos fundamentais da criança, que consiste na possibilidade de crescer numa família (Instituto da Segurança Social, 2017). Nos últimos 10 anos, de 2007 a 2016, e apesar de uma redução de cerca de 18% no número de acolhimentos, o recurso à institucionalização das crianças e jovens aumentou proporcionalmente em comparação com o recurso ao acolhimento familiar. Este estudo recorre ao Questionário de Atitudes de Bem-Estar da Criança (Davidson-Arad & Benbenishty, 2008, 2010, 2016), para identificar as atitudes dos participantes sobre: a retirada das crianças em perigo, a reunificação, a participação da criança e da família biológica nos processos de decisão, e a avaliação do acolhimento familiar e do acolhimento residencial ao nível da promoção do desenvolvimento e do bem-estar das crianças. Com estes dados, pretende-se analisar se há diferenças nas atitudes entre profissionais, nesta área de intervenção, e estudantes, com ou sem experiência na apreciação de casos de negligência familiar, os quais poderão refletir aprendizagens diferenciadoras mais recentes. Pretende-se, também, verificar se é possível identificar grupos distintos em cada amostra em função das atitudes medidas; se há diferenças entre estes grupos em cada amostra e as respetivas características sociodemográficas; e se há diferenças entre as amostras ao nível de cada grupo. A pesquisa integra-se num estudo internacional que decorre em vários países como Israel, Alemanha, Espanha, Holanda e Irlanda do Norte, coordenados pelo Haruv Institute, de Israel, uma organização sem fins lucrativos dedicada à prevenção dos maus tratos infantis. O objetivo principal do estudo é desenvolver recomendações para a prática e compreender melhor o que influencia e determina as decisões, em ambientes caracterizados pela complexidade e pela incerteza, comparando as diferenças e as similitudes entre os vários países e contextos culturais. De facto, cada sistema reflete nas políticas e práticas que adota um conjunto de valores que influenciam o modo como atua, os serviços que desenvolve e as finalidades que prossegue. Do sistema fazem parte integrante as atitudes e comportamentos dos profissionais, associados à tomada de decisão, e a formação inicial dos estudantes, pela influência potencial que pode exercer na sua prática futura, quando transitarem da sala de aulas para o local de trabalho. As medidas de acolhimento no sistema de proteção das crianças e jovens português As crianças e jovens necessitam de compromisso e dedicação individualizada de pelo menos um cuidador, para se poderem desenvolver de modo adequado. Um ambiente que garanta a satisfação das necessidades físicas e psicológicas, de afeto e estimulação, que cuide, proteja e acarinhe (Palacios, 2015). O acolhimento familiar, a par da adoção, é um contexto capaz de fortalecer relações de proximidade e confiança, baseadas no afeto e na atenção, mostrando que “não é triste ter vários relacionamentos afetivos, é triste não ter nenhum” (Gersão, 2014, p. 128). A prioridade dada à Convenção sobre os Direitos da Criança em relação à colocação num contexto familiar, o baixo nível de desenvolvimento social alcançado por crianças e jovens em instituições, a existência de escândalos envolvendo abuso de crianças e jovens em instituições, e a teoria do attachment (Bowlby, 1944, 1951; Rutter, 1991, 1995) têm sustentado um crescente compromisso com o cuidado familiar, considerando o acolhimento familiar como o melhor tipo de colocação para as crianças e jovens que precisam de ser retirados das suas famílias. Esta tendência evolutiva baseia-se numa abordagem centrada na criança, que visa permitir a todas, incluindo as que são acolhidas, o exercício pleno e efetivo dos seus direitos, incluindo o de crescer num contexto familiar (Gilbert, Parton, & Skivenes, 2011). Perante a necessidade de retirada da criança ou jovem da sua família de origem, o acolhimento familiar tornou-se, nas últimas décadas, na maioria dos sistemas europeus na escolha preferencial (Del Valle & Bravo, 2013; Eurochild, 2010). Isto não significa, naturalmente, que para certas crianças ou jovens a melhor solução não possa ser a colocação numa instituição, no âmbito do acolhimento residencial, especialmente para os mais velhos, os que foram retirados com vários irmãos, ou os que têm necessidades especiais. No entanto, se a meta a alcançar é promover a vinculação segura e proporcionar as condições para o desenvolvimento completo, a melhor resposta, geralmente, vem da experiência de viver com uma família (Cairns, 2002; Schofield & Beek, 2006). Portanto, o Sistema de Proteção tem a obrigação de fazer tudo ao seu alcance para permitir que a criança ou o jovem tenha essa possibilidade de colocação. As causas da resistência portuguesa à desinstitucionalização reúnem diferentes origens e dimensões. Historicamente, competia à Igreja Católica e, mais tarde, ao Estado, a responsabilidade de cuidar das pessoas mais desprotegidas. Ao longo do século XX, foram criadas grandes instituições de acolhimento de crianças e jovens, muitas delas da Igreja Católica, de cariz assistencialista, com a missão de apoiar crianças e jovens desprotegidos ou com distúrbios comportamentais, substituindo assim as famílias e a comunidade (Martins, 2006). Atualmente, a rede de centros de acolhimento residencial cobre todo o território nacional e fornece lugares mais do que suficientes para a colocação de todas as crianças e jovens, o que dificulta a opção pelo acolhimento familiar (Instituto da Segurança Social, 2017; Rodrigues, Barbosa-Ducharne, & Del Valle, 2013, 2014). Esta realidade dificulta a mudança, uma vez que essas instituições procuram preservar a sua continuidade, e há resistência e obstáculos dos decisores políticos para promover as mudanças necessárias ao nível humano, físico e financeiro. Todos esses fatores são combinados com uma política social categorial (Pereirinha, 2005), dirigida aos problemas ou riscos sociais da infância e juventude em perigo, que claramente desconsiderou, na última década, o acolhimento familiar em relação ao acolhimento residencial, adiando sucessivamente as campanhas de divulgação, de recrutamento e de seleção de novos acolhedores, e a disponibilização dos recursos indispensáveis para suportar os custos do acolhimento familiar, bem como a implementação de uma política fiscal que favoreça e reforce essa atividade, comprometendo portanto o seu desenvolvimento. Esse adiamento tem sido associado a uma certa ambiguidade na definição do papel futuro das entidades de enquadramento, i.e., organizações sociais sem fins lucrativos, face ao Estado, mais especificamente ao papel desempenhado atualmente pelo Instituto da Segurança Social (Delgado, 2015). A alteração da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo – Lei 142/2015, de 8 de setembro, introduziu alterações significativas no sistema de proteção. Assim, o objetivo da intervenção, a escolha entre as medidas de acolhimento, e o tempo de colocação são bons exemplos do favorecimento do acolhimento familiar, da manutenção da relação com os cuidadores das famílias de acolhimento e da sua permanência nesse contexto, de forma independente ou em paralelo com a relação com a família biológica. No entanto, em 2016, o acolhimento residencial é o destino para 96,9% das crianças e jovens (Instituto da Segurança Social, 2017). Face a esta realidade, o Committee on the Rights of the Child (2014), nas suas observações finais sobre os terceiro e quarto relatórios periódicos apresentados por Portugal, alertou para a necessidade de se desenvolver um processo de desinstitucionalização e o reforço do acolhimento familiar. Ao nível do discurso, nos relatórios anuais de caracterização da situação de acolhimento das crianças e dos jovens, elaborados pelo Instituto da Segurança Social, foi-se assumindo que deveria ser dada mais atenção ao acolhimento familiar. Em 2011, por exemplo, o relatório salientou o número residual de crianças em acolhimento de 0 a 3 anos, em comparação com as crianças da mesma faixa etária em acolhimento residencial, e expressou preocupação com o impacto futuro destas decisões para o seu desenvolvimento, uma vez que que a institucionalização pode levar a “atrasos irreversíveis no desenvolvimento cognitivo” (Instituto da Segurança Social, 2011, p. 66). |
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